Quando examinamos a nossa herança cultural, especialmente na literatura e nas
artes visuais, muitos dos maiores
trabalhos humanistas - peças de Shakespeare, as histórias da
Bíblia, os mitos gregos, os poemas dos sufis - podem parecer enigmáticos, sem sentido ou até mesmo banais, se estivermos olhando para o significado externo. E
mesmo assim eles parecem possuir uma
grandeza incomensurável com seu conteúdo aparente. Eles saltam de nossas
mangas. Certamente essas grandes, nobres obras têm mais a nos dizer?
É claro que estamos familiarizados com a idéia de alegorias e metáforas na literatura: "Meu amor é como uma vermelha rosa vermelha." Se
dermos uma olhada mais de perto, podemos ver que há outra qualidade em algumas obras de arte que podem nos levar a uma experiência mais profunda, que não é
imediatamente explicável ao nível lógico da pintura, da peça ou do poema.
Então, vamos dar um salto de fé e assumir que as peças atemporais de
Shakespeare foram escritas por um ser consciente com uma mensagem para despertar a humanidade. Quando o Bardo diz: "Ser
ou não ser, eis a questão", o que ele quer dizer com esta linha mais
citada, e contudo menos compreendida de Hamlet? Se reformulamos a frase nos
termos do Quarto Caminho, como: "Estar presente e portanto existir, ou
estar adormecido e não existir, essa é a
questão", então, surge o significado para aqueles que trabalham com idéias
esotéricas. É a fundamental—talvez a única—questão no jogo mestre da evolução
consciente. Não é de admirar que essa linha seja tão famosa!
Se formos ver o castelo de
Macbeth não como uma construção
fictícia na Escócia, mas como um mapa dos elementos beligerantes internos de um ser humano que
está começando a ver a si mesmo e desejando despertar, então, o significado
interno dessa peça, também, começa a
se revelar.
As religiões também parecem ter, além do significado
externo, um significado interno que
necessita de ajuda externa antes
de que se possa reconhecê-lo. E se
Moisés simboliza o mordomo, a parte
mais elevada da máquina humana, a parte que deseja promover o despertar? Esta interpretação explicaria porque Moisés conduziu os
israelitas, (os pensamentos que desejavam
consciência) através do Mar Vermelho
da imaginação ou do sono, para Israel, a Terra Prometida, (a presença, Deus). Isso também explica porque Moisés pode ver a Terra Prometida, mas não pode entrar nela, pois a consciência é uma propriedade dos centros superiores,
e não da máquina.
Desse ponto de vista, começamos a ver que os conceitos
de guerra santa ou peregrinação
foram tragicamente mal interpretados
por aqueles que tomaram apenas o
significado literal. Ninguém, por
exemplo, parece lembrar que Maomé disse: "A jihad real é interna.”
Quando Rumi diz:
"Mas por que alguma alma nesse
mundo vai querer escapar do
Amado?", ele está falando
simplesmente sobre o amor erótico ou emocional de um ser
humano? Ou
é um grande
ser espiritual falando de sua união com seu próprio Ser superior?
Ou quando Omar Khayyam
fala sobre os prazeres do vinho, ele está falando sobre as alegrias da embriaguez?
“E, há pouco, pela Porta da Taverna
entreaberta,
Movendo-se em segredo através do crepúsculo
veio um Corpo Angelical
Sustentando um Recipiente em seu Ombro; e
Ele me pediu para prová-lo; e era – a Uva!”
Não. Especialmente quando tal passagem
conduz a linhas profundas,
mas inicialmente opacas, tais como:
“Mahmúd O poderoso, o Senhor vitorioso,
Que todos os infieis e a negra Horda
De medos e Tristezas que infestam a Alma
Espalha e mata com
sua Espada encantada.”
Parece que os sufis corajosamente escolheram o vinho para simbolizar os estados mais elevados que procuravam - a presença de Deus. "Corajosamente"
porque o vinho era proibido, ou pelo menos desaprovado, pelos praticantes de sua religião. E é
Mahmúd, como Moisés, o mordomo,
mais uma vez, o herói de mil faces, que
mata aquelas partes de nós
que se opõem ao nosso próprio despertar?
Quando, à noite antes de sua prisão,
Cristo rezou enquanto seus discípulos "dormiam", estamos seriamente
supondo que seus
seguidores foram realmente sonolentos em um dos episódios mais carregados emocionalmente da história da espiritualidade? No entanto, podemos entender, quando tivermos feito nossos próprios esforços de lembrar de nós mesmos, que, mesmo no momento de desespero de seu professor,
seus estudantes não foram capazes de se
juntar a ele, para estar conscientes, enquanto ele estava consciente.
Parece que com o advento do
ensinamento de Gurdjieff no início do século XX, o conceito de "consciência", "presença" ou "lembrança de si"
tornou-se mais abertamente disponível
para o mundo. Anteriormente, só
havia sido mencionado ou
representado por símbolos, muitas vezes, nos contos de fadas, mitos ou parábolas
que foram amplamente conhecidos. Surge então a pergunta: "Por que
se preocupar em ocultar o significado,
quando poderia apenas ser descrito ou
apresentado como ele realmente é?" Parece haver várias razões possíveis para isso.
Os contos ou peças de teatro apresentados como uma narrativa emocionalmente
carregada são fáceis de lembrar, apreciar, e repetir, e muitos têm resistido ao
teste do tempo. Eles, então, têm a chance de se infiltrar em nossa consciência,
e sua mensagem pode gradualmente se conectar com algo dentro de nós que anseia
pelo despertar espiritual.
Além disso, os símbolos e mitos podem se dirigir às partes mais elevadas em
nós e ignorar as limitações de
nosso intelecto, que é
caracterizado pelo pensamento oposto
que é orgulhoso de sua capacidade
de debater e analisar. O
intelecto rejeita e dilui as idéias
esotéricas com a lógica e a relatividade.O significado interno é alimento para um mundo interior onde as idéias e as impressões não são tomadas literalmente, mas recebidas diretamente,
sem filtros, como as crianças as recebem.
Talvez o dito popular sobre oferecer "pérolas aos porcos"
significa que, se o conhecimento fosse apresentado às partes dentro de nós que
não estão interessadas na evolução espiritual, seria desperdiçado ou perdido.
Usando as "chaves" do Quarto Caminho, muitas das artes mais
profundas e duradouras do mundo revelam mensagens esotéricas destinadas a
contribuir para o despertar das gerações futuras. Se estamos dispostos a deixar
para trás nossos aprendidos hábitos de interpretação, estas obras ganham vida,
e podemos apreciá-las de uma nova forma, que promove o nosso próprio
desenvolvimento espiritual.
Alan B.
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